quarta-feira, novembro 30, 2005

Serviços Van Gogh

Esses dias o meu controle remoto achou que deveria não funcionar mais e por causa disso fiquei forçado a ver os comerciais pra não ter que fazer o esforço hercúleo de levantar pra trocar de canal manualmente. E nesse intervalo comercial vi algo que me deixou intrigado. Se eu não me engano, era um comercial do banco REAL. Eles estavam falando dos "Serviços Van Gogh".

Assim como esse grande artista holandês reinventou a pintura sob nova perspectiva, nossa visão de relacionamento com o cliente também evoluiu.

Evoluiu pra onde!?


Deve ser um serviço bem expressionista. Que leva em consideração o alto teor depressivo que contém um extrato bancário de saldo negativo, com todos aquletes juros estratosféricos e a indiferença de gerentes mal preparados para lidar com os clientes.

Esse tal serviço não deve levar em consideração que o pintor Vincent (como assinava sua obras) era um tanto violento ao retratar a sua realidade com tanta expressividade, pois ele pegava o pincel e simplesmente o batia na tela. Ignora o fato de que ele passou por muita dificuldade financeira e teve crises depressivas tremendas e depois de brigar com um amigo por causa de uma mulher, veio a cortar uma das orelhas. Sem contar o fato de que ele sofria de mania de perseguição, crises de humor e tudo mais que um distinto desequilibrado precisa ter.

Que ironia. Um pobretão expressionista que vendeu apenas um quadro em toda sua vida virando nome de um serviço de banco. O que será o Van Gogh diria?

A redação do Retratismo do Cotidiano recomenda: Serviços Van Gogh: satisfação plena ou a sua orelha de volta.

sexta-feira, novembro 25, 2005

Arrriba, Sancho!!!

Esses dias eu montei um cartaz pra festa de um bar e restaurante de comida mexicana. Esse tal restaurante, que se chama Sancho Panza Cafe, vive em uma terrível contradição (talvez até poderia chamar-se de um equívoco completo) que eu queria mostrar aqui.


É o seguinte: o personagem Sancho Panza era o fiel companheiro de Don Quixote de La Mancha, que era um fidalgo espanhol, e foi escrito pelo, também espanhol, Miguél de Cervantes. Mas o pior vem agora: o logo do restaurante é claramente inspirado nos traços do artista plástico surrealista Joan Miró, que também é espanhol!!! E o mexicano, pra onde foi!?


Se era pra escolher um herói pra dar nome ao bar, talvez um Pancho Villa caísse melhor, ou até um o Zorro - talvez esse não ficasse tão bom. Mas o cara conseguiu ir mais longe: foi lá na Espanha buscar o coadjuvante de um anti-herói que foi protagonista de uma saga que beira o patético e colocou um sombrero na cabeça dele.

Não tenho absolutamente nada contra o Sancho Panza ou contra o Don Quixote e, muito menos, contra o Miró pelo simples fato de eles serem historicamente muito importantes para o mundo literário e artístico de uma maneira geral. O que deixa morrendo de vergonha é ver até onde vai a desinformação do ser humano. Essas coisas que têm aqui no mundo bizarro.


Em homenagem a isso beberei uma tequila.

quarta-feira, novembro 23, 2005

As cinco pessoas que você encontra no céu

Esses dias eu tava assistindo um filme na tv baseado em um livro homônimo chamado "As cinco pessoas que você encontra no céu". (Na verdade não consegui ver o filme todo porque tava com um sono terrível em plena 5 da tarde). Pelo pouco que consegui ver deu pra ter uma idéia do que se passou depois. Essas cinco pessoas te fariam passar por cinco revelações que determinaram o curso de sua vida, ou alguma coisa do tipo. Então fiquei pensando e me perguntando quais seriam as pessoas que eu encontraria no céu (caso para lá eu fosse) se eu morresse hoje. Então selecionei as cinco pessoas (não necessariamente mortas) que de alguma forma contribuíram para que eu fosse o que sou hoje.

1ª Pessoa: Chefe Maurício

O Chefe Maurício é o chefe do grupo de escoteiros que eu participava quando tinha uns 9 anos de idade. Era ele que ensinava todos aqueles conceitos do escotismo que eu carrego comigo até hoje. Ele foi a primeira pessoa que eu conheci que já tinha viajado pra vários países e que outros vários idiomas. Na época era como se o cara tivesse visitado outros planetas de tão distante que essa idéia era pra mim. Mas o que eu achava mais bacana era a coleção imensa de selos e facas de várias culturas que ele tinha. De vez em quando eu lembro da palma escoteira, mas conhecida como "Folha de Chá" e começo a lembrar desse tempo. Ele ensinou outras coisas como: o hino nacional (que quase ninguém sabe todo) e todos aqules nós de marinheiro.

2ª Pessoa: Professor Rui

Ele foi meu professor no segundo semestre da minha 2ª série. Esse ano tinha sido muito conturbado com relação a professores que passaram por aquela turma. Até hoje não sei o porquê de tanta troca de professores em um mesmo ano. Foram quatro no total. Como eu morava em uma cidade de dimensões desprazíveis o professor era conhecido da minha família e, até hoje suspeito que ele queria namorar uma das minhas irmãs. Eu gostava muito dele porque a gente sempre trocava uma idéia no recreio e ele levava uns biscoitos pra comermos enquanto conversávamos. Mas o que me marcou mesmo foi a sua morte. Ele, antes dos trinta anos, morreu de AIDS. Aquela doença era uma coisa tão distante pra mim que quase nem acreditei no que tinha acontecido. Aliás, foi a primeira e única vez que um conhecido meu morreu de AIDS.

3ª Pessoa: Jairo - o noivo da minha irmã

Foi ele quem me ensinou os primeiros passos em matemática. O cara me ensinou a dividir e multiplicar. Apesar de ser meio traumatizado com matemática, foi exatamente ela que determinou o rumo da minha vida em dois momentos cruciais. E, além de noivo da minha irmã, era um amigão. Quando a gente saia pra passear de bicicleta ele só andava voado e eu ficava na garupa me borrando de medo de cair. Era adrenalina pura! Pena que o relacionamento dele com a minha irmã não passou do noivado e a última notícia que eu tive é que ele tinha se casado, virado Metodista e entrou pra polícia militar.

4ª Pessoa: meu melhor amigo Bráulio

Quando eu era garoto, a minha mãe tinha um costume (que eu achava terrível) de me colocar pra dormir depois do almoço e, por causa disso, sair pra brincar só depois das 15:30h. Ás vezes eu conseguia fugir e era pra casa do Bráulio que eu ia. A casa dele ficada de costas pra minha e era só pular o muro, que estaria livre até a minha mãe dar falta e me chamar pro esporro. Eu nem ligava porque a essa altura eu já tava tão cansado e suado que só pensava em água bem gelada (daquelas que dá até uma dorzinha de cabeça se a gente beber rápido). A gente se orgulhava de nunca ter brigado por nada - e eu já tinha brigado com quase todos da minha rua e apanhado da maioria -, e fazíamos questão de dizer que um era o melhor amigo do outro e que ele era mais burro que eu. Na época em que um infeliz inventou de fazer um comercial para incentivar o uso da camisinha dando o nome de "Bráulio" pro próprio pênis, fiquei pensando: "Coitado do Bráulio! Deve estar sendo zuado por Deus e o mundo agora...". Depois que eu mudei de cidade, nunca mais tive notícias dele. Até hoje eu tenho guardado uma foto nossa.

5ª Pessoa: Rogério, meu amigo mudo

O Rogério era bem mais velho que eu e era filho de uma amiga chata que a minha mãe tinha. A gente se dava bem pra caramba porque eu sempre ficava tentando me comunicar com ele. As vezes dava certo e quando não conseguia entender nada, ele escrevia com o dedo no braço pra eu saber o que ele tava querendo dizer. Foi ele quem me encorajou a andar de bicicleta sem as rodinhas. Primeiro ele tirou uma rodinha, depois de um tempo eu mesmo tirei a outra. O cara sempre dava um trato na minha bike, calibrava os pneus, colocava um óleo na corrente, consertava os freios... Era engraçado que, na tentativa de esboçar alguma palavra falada, ele emitia uns sons muito engraçados com a boca. Eu não me agüentava e ria pra caramba e ele não entendia nada. Acho que ele ficava meio puto quando eu ria dele. Depois de grande, ele mudou pra mesma cidade que eu, mas a gente, de grandes amigos, passamos a ser apenas conhecidos. De vez em quando ele aparecia lá em casa, mas eu não tava nem aí - é por essas e outras que eu digo que quando a gente vai ficando adulto, vai ficando babaca.

Se eu morresse hoje, seriam essas as cinco pessoas que eu queria encontrar no céu (se para lá eu fosse). O mais bacana é que além de encontrá-las novamente, eu conheceria o céu delas. Ia ser bem interessante.

terça-feira, novembro 22, 2005

A lacuna é o convite

Esses dias, estava eu cá com os meus botões matutando acerca de o quanto não consigo terminar as coisas que começo. Já perdi a conta das tantas coisas que comecei e nunca terminei. Desde sempre, nunca consigo terminar absolutamente nada que começo. Realmente não sei o que acontece comigo. Quando estou prestes a terminar, vou definhando e parece que de uma maneira ou de outra, acabo deixando de lado para continuar me enganando e achando que algum dia um dia conseguir terminar. Parece que as coisas vão ficando cada vez mais difíceis demais pra continuar. E essas dificuldades se apresentam das mais variadas formas que vão desde uma simples crise de criatividade (acho q esse é o pior de todos), o enjôo total daquilo que se está fazendo ou falta de grana.

(Neste exato momento, estou pensando em como vou terminar este texto. E, acredite, eu realmente não sei mais o que dizer)

Será que o fato de eu nunca terminar nada que começo faz de mim um frustrado? Ou será que é a minha vontade de estar trabalhando em coisas novas suplanta a vontade de terminá-as. Sei lá! A questão é: como terminar aquilo que se começa? Por mais penoso que seja, é sempre bom que sempre termine tudo aquilo que se começa.

(Essa acabou de me ocorrer)

Já imaginou a quantidade de lacunas que vão se formando ao longo de nossas vidas? Uma vez ouvi uma frase de um músico que dizia (mais ou menos) que "a lacuna é um convite, o som é a solução". E é esse convite que ao mesmo tempo em que chama, pergunta porque você não está lá para continuar. O que aconteceu?

(Dessa vez vou conseguir terminar o meu raciocínio e preencher uma lacuna)

Acho que é essa quantidade de lacunas que determina o nosso grau de frustração. É isso! Uma razão é diretamente proporcional à outra. Simples. Portanto, é sempre bom terminar tudo aquilo que se começa, por pior que seja o resultado. Assim, pelo menos teremos a convicção de que, por mais duro que tenha sido a caminhada, ela foi completa.

Mas, apesar de considerar que é sempre bom terminar tudo aquilo que se começa, será que é bom terminar algo que não vale a pena?

quinta-feira, novembro 17, 2005

Meu ouvido não é penico!!!

Esses dias estava eu tomando o meu café da manhã dos campeões (pizza dormida e café com bem leite ninho pra ficar aquela papa no fundo da caneca) e a empregada me liga o som pra escutar pra escutar a "Nojentecinco FM". Até aí tudo bem porque eu tava viajando naquela pizza de ontem sem saber o que estava por me aconcer. Então eis que canaliamente a Ana Carolina começa a cantar "É isso aí". Daí em diante foi ladeira abaixo. E quando entrou o Seu Jorge então... fudeu de vez.

"Eu não vou parar de te olhar...
Eu não vou parar de te olhar...
Eu não vou parar de te olhar...
Eu não vou parar de te olhar..."

Essa foi a coisa mais safada que já ouvi na minha vida. Os caras pegaram a música do Damien Rice e simplesmente jogaram no lixo e cuspiram. Isso é o cúmulo da falta de criatividade, de respeito pela obra alheia, de falta de bom senso e de vergonha na cara. Tem que ser muito calhorda pra fazer um negócio desses.

Mas tudo isso não é o bastante! A "música" faz parte da trilha sonora da novela "Belíssima" e, como a Ana Carolina só faz algum sucesso música de novela, vamos ter que conviver por mais alguns meses com esse lixo, que alguns insistentemente chamam de musica. Essa merda devia vir com uma tarja preta e uma contra-indicação no cd: "Esta produção possui sons nocivos a saúde dos seus ouvidos. A exposição prolongada pode causar danos irreversíveis".

O governo devia criar uma lei proibindo a tradução de músicas par o português. Além de falta de criatividade, é de um péssimo gosto.


sexta-feira, novembro 04, 2005

Corpse Bride
É engraçado como Tim Burton consegue inverter certos valores que nos são extremamente comuns. Por exemplo: em sua última produção ele mostra duas famílias: uma de aristocratas decadentes tentando ressuscitar o pouco prestígio que ainda os resta e outra família de novos ricos tentando alavancar o seu prestígio social casando seu filho Victor com a filha dos aristocratas decadentes Victoria. Até aí nada mais normal pra época, se não fosse pela caracterização dos personagens. Figuras um tanto estranhas em formas extremamente caricatas que fazem desses personagens mais bizarros que os próprios mortos que, aliás, são bem mais simpáticos que os vivos.

Para ele, talvez a morte possa parecer bem mais divertida e interessante (de um ponto de vista bem estranho) que a vida em que vivemos. Tudo isso acontece não só em Corpse Bride*, em “Os Fantasmas se Divertem” esta perspectiva também se confirma.

Não deixe de dar uma atenção especial na música tocada por Victor no piano da casa de sua prometida esposa. Apesar de não passar de dois minutos, é uma execução carregada de obscuridade e ao mesmo tempo cheia de lirismo. Este também é onde a história começa a tomar forma.

O que mais legal da produção também é que, além de ter sido toda feita em bonecos de silicone, para dar mais mobilidade aos bonecos, foi feita em "stop and motion", ou seja, movimenta o boneco aqui e ali depois filma e para, movimenta o boneco aqui e ali, filma e para de novo e assim por diante. Um amigo meu disse que leu em algum lugar que em um dia bom eles conseguiam filmar dois ou três segundos. Daí dá pra ter uma idéia do trabalho que deu pra fazer este filme.

Tim Burton, definitivamente, é um cara muito estranho.



*Me recuso terminantemente em chamar esse filme de "Noiva Cadáver", ás vezes é melhor nem traduzir certos nomes de filmes pra não detonar com a obra antes de sua execução.
Tv a Cabo

Bendito seja o homem que inventou a tv a cabo! Não que eu ache a tv aberta uma merda - apesar de ela passar muito perto disso na maioria das vezes. Ainda dá pra achar alguma coisa boa de vez em quando.

Tem um programa de música clássica apresentado pelo Athur da Távola na TV Senado - que não é uma tv aberta, mas é como se fosse. Sempre que assisto esse programa tenho a incômoda impressão de que sou o único que está dando bola pro que o cara tá falando. Uma vez uma amiga minha que mora em Macapá-AP disse que também assiste de vez em quando e tem exatamente a mesma impressão. O mais engraçado é que eu nunca me liguei pro nome do programa porque sempre pego ele do meio pro final. Acho que o programa se chama "Quem tem medo de música clássica?". Talvez este seja o nome mais apropriado já que música clássica, de tão rebuscada e na maioria das vezes incompreensível aos ouvidos leigos como o meu, é de apavorar. Imagine só você convidando alguém pra escutar o cd novo que comprou: "Hey! Você já escutou este réquiem do Mozart regido pelo Zubim Metha? É lindo!". Vão te chamar de maluco. Talvez seja este o motivo de o Arthur da Távola sempre fazer menção ao que ele chama de "crianças da audiência". Deve ser porque as crianças são mais suscetíveis a este tipo de som. Mas eu sempre assisto ao programa depois de meia-noite... O que será que ele quis dizer com isso?

Uma vez, fizeram uma pesquisa sobre os hábitos televisivos do povo brasileiro e os caras chegaram à conclusão de que boa parte das pessoas que assinam tv à cabo é pra melhorar o sinal da tv aberta que normalmente é muito falho e cheio de fantasminhas. É um verdadeiro desperdício de audiência. Pagar pra ficar esperando o horário do Jornal Nacional se eu posso ter a CNN (em inglês e espanhol), o Fox News, o Glogo News, o Band News? Pra que o meu filho vai ter que deixar de ver os desenhos animados que ele gosta que só passam de manhã, se eu posso ter o Cartoom Network, o Jetix ou o Neckelodeon? Ficar perdendo tempo com tv aberta é muito desperdício de cérebro e dinheiro.

O grande motivo pelo qual a grande maioria assina tv a cabo é a falta de algo interessante pra se ver. O mais engraçado de tudo isso é um problema comum que não é exclusivo da tv aberta. Parece até que os canais combinam um horário e não passam nada que peste, nem aqueles programinhas toscos de cultura inútil - porque nem só de cultura vive o homem. Não adianta zapear pelos seus 200 canais que não vai ter nada pra ver. De vez em quando a Mtv sai do ar e coloca uma mensagem na tela: "Desligue a tv e vá ler um livro".

Depois dessa, fico com um trecho dessa música do Otto: "Acabo de comprar uma tv a cabo / Acabo de entrar pra solidão a cabo".